A MENINA QUE QUERIA
SER BACHAREL
Josiane queria ser bacharel em Direito. A moça tinha uma
moto, tinha medo do escuro, mas andava no breu.
Josiane carregava uma joia, não
estava sozinha. O que ia na cabeça de Josiane quando pegou a contra mão?
Avaliação de riscos. Segundos para decidir entre a contravenção de trânsito e o
medo do viaduto distante, escuro e de mau agouro. Josiane era paranoica? Tinha
delírios persecutórios?
A multa ou sua integridade? Os
pontos na carteira ou a preservação de sua linhagem? Pesadamente, carretas apressadas
tentam escoar a produção e, certamente, devem ter interferido em sua avaliação.
Josiane não é apenas um nome. Josiane é uma comunidade inteira que tenta
aparecer por sobre o número frio da estatística. Josiane é o nome de três mil
estudantes universitários e outras centenas de servidores que arriscam a vida
para mudar a história. Suas histórias pessoais, de seus familiares, de suas
cidades e do nosso país.
Josiane poderia ter feito o
contorno. Logo ali, a 2 km. Josiane poderia ter parado sua moto e cortado o
mato alto para poder ser vista. Josiane poderia ter parado, quando a inscrição
no asfalto solicitou, e calmamente ter entrado no vão escuro do viaduto.
Poderia... Quem sabe até ter enfeitado e iluminado esse vão sem atrativo algum.
Josiane não fez nada disso. Mas essa
unidade estatística fez mais. Josiane mobilizou sua comunidade. Josiane
forneceu os pneus para serem transformados em fumaça preta. Josiane emprestou
as canetas e cartolinas para que virassem protesto. Josiane foi o
convite-convocação entregue a cada autoridade. Josiane segurou o microfone,
regulou o som e promoveu o debate.
Josiane ficou triste de ouvir o Sr.
Fulano de Tal dizer que aquilo era um show. Josiane chorou ao ver que o
empurra-empurra de responsabilidades queriam carregar sua história para a
gaveta eterna. Josiane sentiu falta de alguns representantes e autoridades que
deveriam estar honrando seu nome. Josiane pode se tornar um número que irá compor
algum gráfico no futuro e nesse gráfico nem conseguiremos distingui-la. Pode,
mas não irá. Na impossibilidade física, Josiane conseguiu responder à chamada
de sua professora. Alto e claro ela gritou: Presente!
E todos nós pedimos que ela
permaneça presente e que abra as gavetas empoeiradas, arranque os acordos
firmados e grite, grite muito alto Josiane. E que nós tenhamos ouvidos de
ouvir!
Josiane queria ser bacharel... não
deu! Virou manifesto.